Ministros do TSE põem em xeque estratégia de Lula, mas ex-presidente ainda tem carta na manga

Possibilidade de impedimento de candidatura por decisão "de ofício" divide mundo jurídico, mas advogados ainda podem buscar amparo na Lei das Eleições

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Desde que assumiu o comando do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em fevereiro, o ministro Luiz Fux deixou claro que estuda formas de impor barreiras mais efetivas a candidatos que podem ser enquadrados nos parâmetros da Lei da Ficha Limpa. Em seus primeiros dias no mandato, o magistrado chegou a dizer que, antes de inelegíveis, candidatos enquadrados neste ordenamento jurídico seriam “irregistráveis”, o que deixou implícita a possibilidade de ato de ofício impedir que pedidos de registro de candidatura avancem na Justiça Eleitoral.

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Depois de idas e vindas provocadas por tal posição, começa a ser gestada no órgão jurídico a ideia de, em vez de impedir pedidos de registro de candidatura — mesmo a políticos com elevadas chances de serem declarados inelegíveis na sequência do processo –, evitar que o requerente goze dos direitos de candidato enquanto o processo tramita. Com tantas vias recursais e processos que precisam ser avaliados pela Justiça Eleitoral em um espaço cada vez mais curto de tempo, há temores que na prática a lei acabe sendo “furada” em determinadas circunstâncias.

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Com isso, seria possível que o ministro relator, responsável pela análise de determinado pedido de registro de candidatura apresentado até 15 de agosto, tenha competência para negá-lo de ofício, caso algum impedimento seja observado já nesta etapa. Isso significa que uma candidatura poderia ter dificuldades para ser concedida antes mesmo de qualquer impugnação apresentada por outros candidatos, partidos ou pelo Ministério Público. Neste caso, o candidato estaria impedido de concorrer até uma decisão contrária.

A decisão individual do relator não impediria o restante do trâmite do processo decorrente do pedido de registro de candidatura. Nessa sequência de atos, um candidato com condenação em segunda instância, como o ex-presidente Lula teria seu registro negado por decisão do relator antes do final de agosto. Tal entendimento divide o mundo jurídico, já que não há notícias de precedente neste sentido para eleições presidenciais. Por outro lado, há quem entenda que a análise dos pedidos de registro, a partir da verificação da documentação requisitada, permite um impedimento preliminar.

“A maior vantagem dessa conduta seria evitar que um candidato inelegível, com registro ‘pendurado na justiça’, fizesse campanha e pudesse até ter a foto na urna no 1º turno da eleição. Além disso, a Justiça Eleitoral ganha tempo por já ter uma definição, mesmo que passível de recurso, sem esperar os prazos de impugnação e contraditório”, observou a equipe de análise política da XP Investimentos.

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A defesa do candidato que tiver o registro negado em decisão individual do relator ainda pode apresentar recurso ao plenário do TSE e, depois, ao próprio STF (Supremo Tribunal Federal). Sem registro concedido, o pretendente não teria direitos de candidato, como tempo de televisão e arrecadação. A decisão de pautar no plenário, porém, cabe à presidência, o que torna o desfecho imprevisível.

A despeito desta avaliação especulada, legalmente não se sabe até que ponto é possível impedir alguém de registrar candidatura a algum cargo eletivo e ter os direitos comuns de um candidato até que possa ter o processo eleitoral devidamente julgado no mérito. Para o advogado eleitoral Alberto Rollo, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, essa posição abre a possibilidade para a conclusão mais célere da validação ou não de candidatura em casos como o do ex-presidente Lula. Embora não seja consenso na Justiça Eleitoral, o especialista enxerga espaço jurídico para haver indeferimento de pedido de registro sem qualquer impugnação prévia. Ou seja, o TSE poderia negar o registro da candidatura de Lula antes que o Ministério Público ou adversários precisassem provocá-lo. Depois, corre um processo, mas com o indeferimento valendo — apenas podendo perder eficácia com decisão contrária.

Por se tratar de questão objetiva (pela Lei da Ficha Limpa, condenação em segunda instância implica em inelegibilidade) e passível de verificação pela documentação entregue pelo próprio candidato no ato do registro junto à Justiça Eleitoral, caberia decisão de ofício. “Para a presidência, há essa peculiaridade legal [impedimento de réus na linha sucessória]. Portanto, é óbice constitucional que inviabiliza a negativa do registro de ofício”, observou o advogado especializado em Direito Constitucional Marcones Santos, sócio do escritório Lopes, Leite & Santos Advogados Associados.

Já o advogado eleitoral Cristiano Vilela, sócio de Vilela, Silva Gomes & Miranda Advogados membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP, diz que a possibilidade de se impedir uma candidatura por meio de ato de ofício não tem amparo legal. “Essa argumentação, embora evidentemente ganhe muitos apoios em setores da sociedade não acostumados com as formalidades jurídicas, não tem amparo legal e, pelo contrário, entra em grave conflito com a Constituição Federal e com os procedimentos estabelecidos pela legislação eleitoral”, criticou.

“A legislação é clara ao estabelecer que somente após o cumprimento do ritual previsto na Lei Complementar 64/90, com prazos para apresentação de impugnação, defesa, eventual oitiva de testemunhas, alegações finais etc., é que se pode decidir pelo indeferimento de candidatura”, ressaltou Vilela. “Não se está diante de um mero elemento interpretativo, mas sim diante da letra da Lei e com a jurisprudência uníssona de todos os Tribunais Eleitorais do País”, complementou.

A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, sinalizou ter entendimento similar. Em entrevista ao programa Canal Livre, da Band, transmitido na madrugada de segunda-feira (21), ela refutou a possibilidade de uma candidatura ser bloqueada sem contestação prévia. “O Judiciário não age de ofício, age mediante provocação”, afirmou.

Se, por um lado, uma nova interpretação sobre decisão de ofício pode preocupar ainda mais Lula e a ala petista que defende a estratégia da manutenção de sua candidatura neste momento, por outro, a defesa contra com um trunfo importante nas mãos, além da própria divisão do meio jurídico sobre o tema. A Lei das Eleições diz que o candidato sub judice pode “efetuar todos os atos relativos à campanha eleitoral, inclusive utilizar o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão e ter seu nome mantido na urna eletrônica enquanto estiver sob essa condição”. Este novo imbróglio pode ensejar provocação ao TSE para decidir, antes da eleição, os limites de ação a candidatos nesta situação.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.